Presente de Dia das Crianças

Era tão certo quanto o café na saída do restaurante à quilo na Visconde de Inhaúma, onde nós íamos pelo menos uma vez por semana , encontrá-lo logo após a porta .
Pequeno , físico mirrado , roupas simples , quase sempre de short surrado , camiseta e sandálias de dedo , nos abordava na saída oferecendo seus serviços de engraxate ou em caso de negativa nos pedia umas moedas .
Nunca engraxava meus sapatos mas sempre lhe destinava as moedas do troco recebido após pagar o almoço .
Naquele dia , véspera do dia das crianças , resolvi na hora agir de forma diferente .
Quando me abordou lhe perguntei :
- Você já almoçou ?
A resposta foi sincera e no tom que os humildes sempre empregam .
- Não Tio , no final do dia separo um dinheirinho e como um salgado na padaria, antes de ir para casa e levar o dinheiro para minha mãe .
Avisei-lhe então que se preparasse pois iríamos entrar de novo no restaurante e ele poderia pedir o que quisesse, tudo por minha conta , sorvete ou qualquer outra sobremesa incluídos.
Sua alegria e sorrisos são lembranças que carrego até hoje .
Entramos de volta e me pediu se ao invés de sentar não poderia ele fazer uma quentinha , já que tinha um amigo que com ele dividia o salgado quando não tinha ele o suficiente para comprar um.
A lição da solidariedade entre os necessitados me atingiu com força , porque não havia eu feito mais antes .
Ainda neste espírito vejo um segurança da casa se dirigir ao menino, a enxotá-lo do salão.
Com voz fria e firme perguntei ao segurança qual era o problema , estava o menino sob minha responsabilidade , a despesa correria por minha conta, o problema estava na presença do menino ou na qualidade do serviço da casa ?
Impressionante é como a visão de alguém em boas roupas e com voz firme produz resultado imediato naqueles que são covardes.
- Não doutor , não há problema algum .
Pois podendo escolher entre camarão , peixes , churrasco , frios diversos , saladas , montou o menino sua quentinha com pedaços de frango , arroz , batatas,  farofa e feijão.
Na hora de pesar sua quentinha me perguntou se podia mesmo pegar sorvete.
Respondi que sim , toda promessa é dívida e os filhos de meu pai mantêm a palavra .
No caixa se dirigiu a funcionária que tinha um enorme sorriso a lhe exibir .
- Viu Tia , hoje eu vou almoçar direito.
Paguei e saímos , a caixa começou a segurar o choro com lágrimas a correr pela face.
No lado de fora me pediu para abaixar , me deu um abraço apertado , carinhoso, e saiu em alegria a chamar o amigo na rua  para divisão do almoço .

O valor e a alegria daquele abraço trago até hoje.
Foi um enorme presente , pois naquele dia a criança que em mim vive foi presenteada.

Comentários

Anônimo disse…
Adorei seu momento de solidariedade. Porém acho que momentos são passageiros. E esse sentimento que lhe assolou nesse momento, deve ficar para sempre em seu coração. Assim são feito os Humanos repleto de sentimentos, porém nem sempre com oportunidade de expandi-los!
Su.
Anônimo disse…
Muito bom !
Charles Netto disse…
Que bom que você pude sentir o valor de dar um presente que muitas vezes faz mais bem para quem da o presente do que para que o recebe, uma vez que em um certo tempo passado aprendi e trago que maior alegria há em dar do que em receber, ok!

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